Eu vim aqui para a Barra em 1978, quando nasceu meu segundo filho, o Bruno. Já viemos direto para cá. Morei um ano na Tijuca, na Rua do Matoso, depois começou aquele negócio do metrô, daí muita obra, muitos bate-estacas e tal

Claudio Magnavita - Zico, isso nasceu como fruto de um sonho, mas não foi por acaso. Há quantos anos você elegeu essa região da zona oeste, Barra e Recreio, para ser o centro de suas atividades? Seus filhos foram criados aqui, então?

Zico: Sim, foram todos criados aqui. Eu vim aqui para a Barra em 1978, quando nasceu meu segundo filho, o Bruno. Já viemos direto para cá. Morei um ano na Tijuca, na Rua do Matoso, depois começou aquele negócio do metrô, daí muita obra, muitos bate-estacas e tal. Daí mudei para um alugado em Ipanema, mas já tinha comprado um apartamento aqui na Manuel Brasiliense, aqui na Barra. Mudei pra cá quando ficou pronto e estou na Barra desde 78. No início foi difícil, principalmente, para Sandra, porque para tudo você tinha que pegar um carro. e ali foi a única vez que tive a possibilidade de ser síndico, mas nem assim eu quis. Coloquei o vigia para ser síndico. Era eu, sozinho, no prédio; era um prédio de dois andares, aquele gabarito que tem no Jardim Oceânico. Eu morava no segundo andar, que dava para cobertura também. Então éramos oito moradores. Fiquei ali durante três anos, até que comprei uma casa na Júlio de Moura e depois comprei um terreno aqui no Condomínio Mar Norte, e é onde moro até hoje; em 1986 eu fiz minha casa do jeito que eu queria e tal, e estou lá até hoje. Então, como sempre me senti muito bem aqui na Barra, sempre gostei da região, tive a oportunidade de criar um time de crianças que se chamava ‘Nova Geração’, a gente jogava bola ali no Condomínio Santa Lúcia. Era um time com os meus filhos, meu sobrinho, filhos de amigos de ex-jogadores. Até que a gente tinha dificuldades, não tínhamos muitos campos aqui, quando surgiu a oportunidade desse terreno em que estou hoje. Era um terreno de 17 mil m² e um ano depois, comprei mais 17 mil m² colado e fiz o Centro de Futebol Zico, que inaugurei em 1995. Foi dia 20 de janeiro, dia do aniversário do Rio de Janeiro. Já são 22 anos aqui no Centro de Futebol Zico.

Magnavita: Agora, é impressionante como isso aqui tem um poder de atração turística. Você tem conversado com a Convention Bureau, com a Associação de Hotéis, e transformar isso, como existe no mundo inteiro, o futebol tem esse poder de atração, em permitir visitantes... Como você pensa a justificação do Centro Zico?  É um destino natural, né?

Zico: É um destino natural. A gente tem que preparar algumas coisas, porque aqui a gente é sempre muito visitado. A gente tem muitos evento.

Magnavita: Internacionais e nacionais?

Zico: Sim, internacionais. A gente tem a Copa Amizade Brasil-Japão, que eu faço há 18 anos, que vêm quatro times do Japão e jogam os principais times do Brasil, times
grandes, o sub 15. Tem a Copa Zico que a gente faz duas vezes por ano, nas férias, em julho e também em dezembro, ou às vezes janeiro. Aqui, durante a Copa do Mundo e a Copa das Confederações foi o CT dos árbitros, os árbitros fizeram toda a parte de treinamento durante as olímpiadas; foi alugado pelo comitê organizador e vieram diversas seleções até aqui. Times que vêm jogar aqui no campeonato brasileiro, nas competições sul-americanas, libertadores, vêm treinar aqui. Então a gente procura ter um fluxo bom de receptividade. Tem aqui uma galeria com um pouco da minha história, uma boutique, uma lanchonete, um campo de futebol para a moçada brincar, temos hoje, funcionando bem, fisioterapia; até para explicar, às vezes as pessoas pensam que fisioterapia é só para atletas, não. A fisioterapia está aberta para a comunidade toda, para quem tem algum problema, a fisioterapia está aberta. Meu fisioterapeuta, que ficou comigo na seleção japonesa, porque levei para o Kashima, Antônio Ricardo, está aqui.

Magnavita: Estávamos observando que as instalações são de primeiro mundo, não?

Zico: Instalações, realmente, com toda uma aparelhagem e você tem uma parte de recuperação. E também os campos para você fazer a parte final, para testar se está indo tudo bem. A gente aluga para festas de crianças, esses aniversários que o pessoal gosta de fazer jogos para a garotada. Hoje em dia, de 18:00h às 23:00h, tem três campos sintéticos para os “peladeiros”; então a gente tem diversas atividades aqui... Vasco já ficou aqui, Fluminense já ficou aqui durante um período treinando, Flamengo já ficou, Botafogo já ficou, agora está o Boavista. A gente procura sempre dar uma dinâmica aqui no Centro.

Magnavita: Agora, Zico, o crescimento transformou isso em um latifúndio. Porque quando você veio para cá não tinha nada! Me conta desse lado pioneiro seu, inclusive chegando até hoje com o BRT na porta, o metrô na Barra, isso era impensável...

Zico: Era, sem dúvidas. Muita gente me chamou de maluco por comprar um terreno aqui para fazer um centro de futebol, então hoje é uma realidade. Eu acabei sofrendo um pouco porque na época, o ex-prefeito Luiz Paulo Conde, que idealizou todo o nosso projeto, ele achou canos em baixo, e depois que houve um crescimento o greide da rua subiu quase um metro. E eu fiquei em baixo, então passa um rio aqui do lado e outro atrás, e esse rio está assoreado, então para gente é muito ruim. Quando chove, eu fico em baixo.

Magnavita: Você fica vulnerável?

Zico: Eu fico muito vulnerável. Já fui na prefeitura várias vezes, no estado... alguns já fizeram alguns trabalhos paliativos, mas é um trabalho que precisa ser feito não só para mim, mas para toda a região. Porque tem lugares que, quando chove, continuam alugados, continuam alagados, e leva algum tempo. Ainda bem que nesses grandes eventos de copa do mundo, não tivemos chuva.

Magnavita: Mas nós não podemos contar com o elemento sorte com a profissionalização do futebol no Brasil, e de um equipamento como esse. Eu acho que nosso “síndico”, já que você fala assim, da Barra da Tijuca, que é o Tiago, ele vai dar uma acessibilidade aqui. O Jornal da Barra faz um apelo à prefeitura para que olhe com carinho, porque não é um problema do Zico, é um problema do entorno e todos, são milhares de moradores vulneráveis. Zico, e essa evolução da Barra, você imaginaria que a Barra tivesse importância olímpica que teve durante as olimpíadas?

Zico: É difícil imaginar. A gente sabia que o crescimento só podia ser para essa região, mas não sei se chegaria a tanto. Eu sou do tempo em que aquela Ayrton Senna era uma “pontezinha” de madeira. Eu passei a gostar da Barra por isso; eu vinha lá de Quintino, em 1971, 1972, e às vezes só tinha aquele caminho, que era uma “pontezinha” de madeira. Às vezes a gente chegava ali e ela afundava, e a gente tinha que vir pela estrada onde tem a floresta, a estrada velha da Tijuca, daí fazia aquele caminho, do Joá.

Magnavita: Você passava no Bar do Oswaldo, não?

Zico: Passava. Subia ali no Joá, depois pegava a Niemeyer, esse era o caminho que eu fazia de ida e volta de Quintino. Não pegava aquele trânsito maluco todo. Antes,
no início, não tinha o Rebouças, depois que foi criado o Rebouças, talvez tenha ficado mais fácil. Então eu fiz muito aquele trajeto; pra voltar eu só voltava por ali. E ali em São Conrado tinha um restaurante de um amigo do Flamengo, a gente parava lá para fazer um lanche porque a viagem era longa.

Magnavita: E seus filhos, criados na Barra. Você sentiu alguma diferença em eles terem sido criados numa região com essa liberdade e qualidade de vida?

Zico: Eu sinto de algumas coisas de movimentação, porque ficaram muito concentrados aqui na Barra. Então, às vezes, até mesmo para ir para o Maracanã eles tinham dificuldades de ir sozinhos. O meu filho mais novo não sabe andar pela zona norte, então tem que ter sempre alguém com ele. Mas eles vão numa boa, depois que alguém ensina, eles pegam com facilidade.

Magnavita: Como é sua agenda, hoje, na Barra? Qual é o restaurante que você gosta?

Zico: Tem muitos restaurantes que a gente vai. Primeiro é o do meu compadre, Jean Carlos, que é no interior da Barra, que era ali na Olegário Maciel e depois ele passou para o outro lado da Barra, depois do Oswaldo, onde tem um largo lá em cima...

Magnavita: O italiano?

Zico: Isso, o La Botticella, exatamente. É do meu compadre. Mas frequento todos os restaurantes; agora temos muitas opções. Abriram o Duo, que gosto muito, tem o
Gero, tem o Padano...

Magnavita: O Duo, inclusive, com dois; no CEO, perto do Via Parque, e o original...

Zico: Agora tem outro lá perto do península, já estive lá também, sou muito amigo do Dionizio; ele é o grande sommelier do meu filho Thiago. Ele quem indicava
tudo para meu filho, é um grande amigo. E também, agora, tem Capim Santo, Pobre Juan, o CT, o Naga... a gente tem muitas opções aqui.

Magnavita: Quando você recebe seus amigos e visitantes internacionais, eles ficam surpresos com a dimensão desse lifestyle quase que de Miami que temos na Barra?

Zico: Não, a maioria do pessoal já tem noção de que vão ter e seguir. Então quem mora por aqui pode viver por aqui, morar por aqui, tem muitas opções: cinema, teatro, restaurantes. Então você pode mais. Tem lugares onde poderiam ter vários eventos, como por exemplo a Cidade das Artes, que acho que é um local que pode ser muito bem aproveitado, o Parque Olímpico que foi criado agora. E outra coisa, as vias de acesso, hoje, estão com muito mais facilidade. Mas antes de fazerem aquele viaduto ali em São Conrado-Barra, ali você pegava transito desde lá na zona sul, agora você só pega na Barra. E ainda mais com metrô vindo aqui, metrô, BRT. Essa ligação ficou uma maravilha.

Magnavita: Para finalizar, esse movimento do Museu Zico, apenas uma parte das suas coisas estão na Barra?

Zico: Aqui não tem muitas coisas minhas, as minhas estão todas em casa. Aqui tem mais as do Centro. A escola de futebol participou de diversos torneios, ganhou muita coisa. Então esses acervos estão aqui. Tem algumas coisas minhas, principalmente diplomas e tal, mas os troféus mesmo estão lá em casa. Estamos pensando nessa possibilidade.

Magnavita: Tem que ser na Barra?

Zico: Tem que ser na Barra, na região. A gente tá conversando, a RioTur, essa coisa, quem sabe, pode ser na Cidade das Artes. Acho que vai ser legal, vai ser uma boa atração.

Magnavita: Um outro equipamento esportivo é o Museu da Seleção. Ele poderia ter uma outra dimensão aqui na Barra também?

Zico: Ele está muito “fechado”. Acho que ali na sede, o maior problema é o acesso; questão de estacionamento, de visitantes e tal. A história do futebol brasileiro é muito rica. Ninguém foi campeão mundial cinco vezes, não pode ser contado dentro de uma forma tão fechada. Acho que deveria ser muito mais amplo para que o brasileiro pudesse ver mais de perto o que é a seleção brasileira.

Magnavita: Uma palavra sobre o Jornal da Barra? Agora a Barra está com um jornal de verdade, o que você achou?

Zico: Eu achei muito bacana, muito importante, porque você tem tudo o que acontece em toda região. Normalmente se tem jornais de bairro, algumas revistas pequenas, mas um jornal da Barra vai ser altamente importante para a comunidade ver de perto tudo o que está acontecendo, porque daí você vai ver, de verdade, a Barra num geral. O Recreio também, que são dois bairros que se juntam. Então eu achei muito bacana, desejo sucesso, e que o jornal possa, realmente, motivar cada vez mais o morador a dar mais valor a região.

Magnavita: Uma mensagem final, para encerrar, ao morador da Barra? Você como pioneiro da Barra.

Zico: Eu fico muito feliz de ver a Barra como ela é, porque eu fui um que acreditei nesse crescimento, achei que realmente estava fazendo uma boa ação em termos de moradia, em termos de tranquilidade, qualidade de vida. Eu acho que não estava errado, e que o morador aproveite essa linda região.

CFZ

O crescimento esportivo da Barra é visível, principalmente depois dos Jogos Rio 2016. Novas arenas de entretenimento e áreas de lazer ficaram de legado no complexo do
Parque Olímpico. Entretanto, longe disso, um centro de futebol já estava instalado há tempos na região. Fundado em 1996, no Recreio dos Bandeirantes, o Clube de
Futebol Zico (CFZ) é um marco para formação de futuros craques da paixão nacional.

O CFZ funciona como um clube-empresa, onde uma agremiação é construída com moldes de obter lucros por meio de atividades esportivas. O grande objetivo de Zico era dar oportunidade para jovens atletas em competir. Foram formadas equipes nas categorias mirim, infantil, juvenil, júnior e profissional.

Assim como o dono, o CFZ nasceu predestinado ao sucesso. Disputando em 1997, a terceira divisão do Campeonato Estadual, o clube conquistou o título após vencer o Duquecaxiense por 1 a 0 na decisão. Atualmente o clube disputa a segunda divisão do carioca. Na última rodada da edição deste ano, o CFZ empatou com o Mesquita por
2 a 2 e terminou na terceira colocação do grupo X, com 20 pontos.

Nas categorias de base, a sorte se repetiu. O pré-mirim foi campeão da copa Roberto Dinamite em 2004; da Copa Rio, em 2008; e do Estadual e Brasileiro, em 2009. O mirim foi campeão estadual em 1999. O infantil, da Copa Integração, em 2002; da Copa Guilherme Embry, da Amizade e da segunda divisão estadual, tudo em 2003. O juvenil faturou a segunda divisão do carioca em 2000. Os juniores foram tricampeões da série B (1999, 2000 e 2002), da Copa Sendas e da Copa Integração, ambas em 2005. Além disso, levantou as taças do Otávio Pinto Guimarães (1999 e 2000), da Copa Integração em 2001 e a Série C novamente, desta vez em 2004.

Em agosto de 1999, Zico expande o CFZ, inaugurando uma filial em Brasília. Passados 15 anos de sua fundação, o clube se licencia das competições estaduais, se desfiliando do quadro da Federação de Futebol do Rio três anos mais tarde.

Atualmente, o CFZ funciona como um centro de eventos esportivos. Há 18 anos, por exemplo, acontece a Copa Amizade Brasil-Japão, quando quatro equipes nipônicas enfrentam times grandes do Brasil. Além disso, serve de espaço de treinamento para clubes, “peladas” e festas.

Morador da Barra desde 1978, Zico viu todo o crescimento do bairro de perto. Desde os primeiros condomínios até os Jogos Olímpicos, passando pela inauguração do Barra
Shopping, o Galinho de Quintino foi chamado de maluco por alguns amigos ao comprar um terreno baldio na região. Terreno esse que hoje carrega um dos maiores patrimônios do futebol nacional, um centro esportivo de dar inveja a muitas agremiações pelo país, principalmente para os quatro grandes do Rio.