O cérebro dos ratos foi infectado com um vírus durante da técnica dos cientistas

Cientistas de universidades da China e dos Estados Unidos conseguiram reverter sintomas de Parkinson em ratos ao modificar os astrócitos -um tipo de célula abundante no cérebro- para fazê-los se comportar como neurônios. A conversão permitiu restaurar a produção de dopamina nos animais.

Os astrócitos existem no cérebro em quantidade muito maior do que os neurônios. Eles exercem funções vitais para o funcionamento dos neurônios, como a transferência de nutrientes e a proteção contra substâncias danosas.

Os pesquisadores usaram uma técnica de edição genética para inibir uma proteína chamada PTB nos astrócitos. A ausência dessa proteína permite que o astrócito se converta em uma célula produtora de dopamina, como os neurônios.

Na técnica usada pelos cientistas, o cérebro dos ratos foi infectado com um vírus que funcionou como uma tesoura para extrair a proteína.

Os ratos geneticamente modificados usados no experimento não tinham a doença, mas passaram por reações químicas que criaram neles uma condição parecida com a de humanos com Parkinson: a morte de neurônios em uma região do cérebro chamada de substância negra. A falta dos neurônios na área levou à queda na produção da dopamina, um neurotransmissor que desencadeia impulsos nervosos pelo corpo. Assim, sintomas característicos da doença, como problemas motores, apareceram também nos animais.

De acordo com os resultados publicados em artigo nesta quarta-feira (24) na revista Nature, um dos periódicos científicos mais prestigiosos do mundo, as células convertidas passaram a ter função semelhante à dos neurônios perdidos pelo mal de Parkinson, e o comportamento motor dos animais foi restaurado.

O Parkinson não tem cura, mas há uma série de medicamentos e terapias que conseguem controlar os sintomas por alguns anos.
Erich Fonoff, neurocirurgião e professor da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), explica que as doenças neurodegenerativas surgem com o envelhecimento e a morte precoce de células do cérebro. "O artigo mostra um avanço, mas temos um longo caminho até a técnica virar um tratamento", diz.

"No modelo, os animais têm a perda de células do cérebro, como acontece na doença, mas o motivo não é o mesmo; os ratos não têm Parkinson. Os modelos usados são muito bons, mas ainda são falhos", afirma o médico.

"Será que, nas pessoas com a doença, as células novas produziriam dopamina? Ainda não sabemos se funcionaria em humanos da mesma forma", diz Fonoff.

Para a professora e pesquisadora brasileira Tatiana Rosado Rosenstock, pós-doutora pelo Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC), da Universidade de Coimbra, em Portugal, são necessários estudos para entender as consequências do uso da técnica em um prazo mais longo.

"Ainda não sabemos se a inibição da proteína ou a diminuição no número de astrócitos trazem algum prejuízo para o funcionamento do cérebro no longo prazo", afirma Rosenstock.

Mesmo com a necessidade de novos experimentos com a técnica, a pesquisadora afirma que o artigo abriu margem para o uso do método em humanos no futuro. "A técnica também poderia ser testada em regiões do cérebro afetadas por outras doenças neurodegenerativas", diz.