Como a família Sá, ao longo do século XIX, perdeu a concessão das sesmarias da Barra da Tijuca

Por Marcelo Perillier

Desde a chegada dos portugueses, a família de Estácio de Sá comandou grande parte das terras do Rio de Janeiro. De geração em geração, elas sempre ficaram sob o domínio dos Sá. Porém, com a morte de Vitória de Sá, que para conseguir um lugar no céu entregou o Engenho do Camorim e parte das terras de Guaratiba para os monges beneditinos, a situação foi se deteriorando para esta família.

Mesmo assim, mais de 90% da grande sesmaria da Barra, por conta da Lei do Morgadio, ainda pertencia a Martin Correia de Sá e Benevides e João Correia de Sá e Benevides, filhos de Salvador Correia de Sá e Benevides.

Em 1678, Salvador Correia de Sá e Benevides contestou a doação de Vitória de Sá nos tribunais de Lisboa e da colônia. Sabendo que a situação estava complicada ao seu favor, Salvador fez um acordo com os beneditinos, aceitando entregar a terra a eles, mediante pagamento de cinco mil cruzados de indenização.

Por mais de duzentos anos, o Mosteiro de São Bento ficou sendo o responsável pelas terras do Arroio Pavuna, Vargem Pequena, Vargem Grande e Guaratiba. E, para deixar de testemunho isso, uma pequena recordação sobrevive até hoje: a capela de Nossa Senhora de Monteserrat, em Vargem Pequena.

Tendo a posse de um grande terreno e de um engenho, os monges investiram pesado na plantação de cana de açúcar, além, claro, da produção da farinha de mandioca. Entre 1789 e 1793, o abade Dom Antônio do Desterro Gouveia, visando fazer concorrência aos ingleses, instalou uma fábrica de anil, produto usado como corante azul, no local. Porém, o negócio deu mais prejuízo que lucro e faliu.

A partir de 1950, com a Lei Euzébio de Queiroz, a qual proibia o comércio de escravos no Brasil, a situação nos engenhos e plantações beneditinas começa a também balançar, já que o império estava dando sinais de que a escravidão poderia terminar um dia. Em 1871, com a Lei do Ventre Livre, a situação piorou e, em 1888, com a Lei Áurea, as fazendas e engenhos iniciaram de vez o processo de decadência.

Assim, em 1891, o abade Manoel de Santa Catarina Furtado vendeu as terras para a Companhia Engenho Central de Açúcar e Álcool de Cana de Jacarepaguá, cujo chefe era o juiz de órfãos Francisco Teles Barreto de Meneses, pertencente a uma família bastante nobre e com dinheiro na época. Entretanto, para pagar aos beneditinos o valor de duzentos e cinquenta contos de réis, para fazer face aos impostos devidos ao Tesouro Nacional, Francisco fez um empréstimo ao Banco de Crédito Móvel.

Como Francisco não honrou o empréstimo no tempo estabelecido pelo banco, o empreendimento se tornou o dono das escrituras e, consequentemente, das terras.

Já as terras de Salvador, Martim e João Correia de Sá e Benevides, após o fim de Lei do Morgadio, em 1821, foram repassadas, via Carta de Arrematação, para Antônio Serpa Pinto. Mais tarde, elas foram subdivididas em sete geblas e revendidas para grandes empresários no início do século XX.

A polêmica

Mesmo o Banco de Crédito Móvel tendo adquirido as terras do Mosteiro de São Bento, que herdou, via testamento, de Vitória de Sá, após um acordo com Salvador Correia de Sá e Benevides, Martim Correia de Sá e Benevides, filho de Salvador, as revendeu, em 1843, para o empresário Aldo Bonardi.

Em 1928, Bonardi vende essas terras para Abílio Soares de Souza, que, por sua vez, as repassa para Mohamad Ismail El Samad, mais conhecido como “libanês da Barra”, em 1981.

Esse processo se arrastou durante anos na justiça brasileira e apenas no final do século XX ele teve um veredicto final, a favor da Esta, controlada pelo singapuriano Tjong Aiong Oei, mais conhecido como “chinês da Barra”, que morreu em outubro de 2012, aos 89 anos.

A capela

Esta capela foi construída em 1732 em honra de Nossa Senhora do Pilar. Porém, em 1880, a capela de Nossa Senhora de Montserrat, situada em Vargem Grande, foi derrubada por um vendaval e a imagem de foi trazida para Vargem Pequena. Foi desta forma que a capela de Nossa Senhora do Pilar acabou virando Nossa Senhora do Montserrat.

A capela está situada no alto do monte a 120 metros de altura e a 300 metros da estrada dos Bandeirantes. Esta construção histórica era chamada de “joia do império” pela sua beleza e localização. Infelizmente, na década de 1960, ela se encontrava muito degradada e abandonada e, por esta razão, a imagem de Nossa Senhora do Montserrat foi levada para o Mosteiro de São Bento, já que foram os beneditinos quem a construíram, e onde se encontra até hoje.

A capela foi tombada pelo Patrimônio Histórico e, com muita luta e empenhos da comunidade de Vargens foram iniciadas as obras de restauração, apoiada pela Fundação Roberto Marinho e Atlantic Petróleo, em 1986.

Antes do término da obra, porém, a Atlantic retirou o seu apoio e a parte física da obra foi então finalizada pela Fundação Roberto Marinho. Mas, infelizmente, faltou o altar. Em 2015, surgiu a uma possibilidade de restauração e o altar foi, então, desmontado para receber um tratamento contra cupins.

O financiamento prometido não apareceu e agora o povo de Vargens precisa de ajuda para finalizar o altar para, finalmente, a capela receber de volta a imagem de Nossa Senhora de Montserrat.