"É um filme bonito e vistoso, mas também confuso e raso"

Por: João Victor Ferreira

O Pintassilgo é o mais novo longa metragem de John Crowley, diretor irlandês que fez o indicado ao Oscar Brooklyn. Após sobreviver a um atentado terrorista em um museu de Nova Iorque, Theodore Decker (Ansel Elgort/Oakes Fegley) perde a sua mãe na tragédia, apenas ficando com um quadro famoso. O filme é a história de vida de Théo, entrecortada pela sua infância turbulenta (Oakes Fegley), até as consequências de tudo em sua vida adulta (Ansel Elgort). 

Temos aqui um roteiro, adaptado da obra homônima de Donna Tartt, cujo livro tem 700 páginas, aqui transpostos em 148 minutos de filme. Ao olho nu, esse seria um bom equilíbrio de tempo para uma adaptação de um livro, certo? O grande problema aqui é a falta de sutileza e sofisticação em adaptar uma obra densa, adequando-a para uma mídia que não pode se utilizar dos mesmos recursos que um livro tem (a começar por algumas narrações fora de tom que tiram o espectador da dinâmica do filme). Toda adaptação requer cortes, resumos, simplificações para que o filme consiga acontecer. O problema do roteiro de Peter Straughan é acabar atirando para todos os lados, criando uma trama esquizofrênica e que não dá pontos de apoio para o público seguir com a história de Théo. O que vemos aqui não é um trabalho de adaptação, mas sim uma tentativa de resumo de todos os eventos possíveis do premiado livro. O quadro, que dá nome ao título do filme, aparece e some da trama, quando o roteiro bem entende, se tornando algo tão irrelevante que acaba não tendo espaço no meio de tudo isso. O filme acaba perdendo profundidade e foco, se sustentando mais por momentos marcantes e sensíveis, do que necessariamente pelo conjunto narrativo. 

O elenco é de peso, mas as interpretações não são memoráveis. Destaque para Finn Wolfhard que tem a melhor participação como personagem do filme. Jeffrey Wright também consegue entregar bons diálogos em momentos chaves. Nicole Kidman cumpre bem seu papel, mas a história não dá muito mais o que ela fazer. A interpretação de Oakes Fegley é mais convincente do que a versão adulta de Ansel Elgort.  

Os aspectos técnicos do filme tem o seu valor. Roger Deakins faz aqui um trabalho bom, mas nada marcante, comparando com outros trabalhos da sua carreira de fotógrafo. Quando o filme se passa em Las Vegas, Deakins parece ter mais o que dizer, com enquadramentos mais vistosos e uma iluminação que combina com a palheta de cores mais neutras do local. O design de produção aqui é sensacional, já que em diversos momentos ajuda a contar a história do filme, ou pelo menos dos personagens. Novamente no segmento de Las Vegas, o protagonista usa roupas com cores mais pastéis que quase o camuflam com o lugar desértico: algo que fala muito do estado de espírito de Théo com a mudança de lar. A mixagem e a edição de som também tem o seu papel, dando textura e, em alguns momentos, cheiro para certas cenas. Destaque para as cenas na loja de antiguidades que te fazem se sentir naquele ambiente rústico. 

Esse filme também é uma aula eficaz para mostrar a diferença entre edição e montagem. Os cortes são bem feitos e, em alguns momentos até inventivos, mas a montagem do filme é problemática, muito em decorrência do roteiro pulverizado. Como o filme se passa em dois momentos chaves da vida de Théo, essas transições deveriam ser melhor trabalhadas. Mas acaba que a montagem muda de um para o outro quando bem entende, gerando esse descompasso da trama e afetando também o ritmo do filme. Há aqui uma clara discrepância entre esses dois momentos distintos (e que coincidem com a mudança do ator mais novo, para o mais velho). Théo quando criança tem mais o que fazer, ele está se conhecendo e superando um trauma: a trama anda. Théo adulto perde objetivo e vive ressonante dos eventos do passado: a trama estagna.  A quantidade imensa de personagens que giram em torno do protagonista, dificulta ainda mais o desenvolvimento dos coadjuvantes, deixando todos muito rasos e com o propósito apenas de interagir com Théo. 

O Pintassilgo é um filme bonito e vistoso, mas também confuso e raso. Ele aposta em uma dinâmica perfeita para ganhar estatuetas no Oscar que é a famosa “trama biográfica”, mas acaba querendo falar de tantos eventos da vida do seu protagonista, que acaba não dizendo nada.