O Rio de Janeiro é o quinto Estado do Brasil que mais precisa de transplantes, de acordo com o Ministério da Saúde
Por Mariana Aguiar
O Setembro Verde é uma campanha criada para promover a conscientização sobre a importância da doação de órgãos e tecidos no Brasil. O ato da doação pode salvar muitas vidas, porém é um assunto pouco divulgado e conversado na sociedade brasileira. Esse tipo de tabu impede com que muitos indivíduos se tornem doadores e ajudem o próximo. Para desmistificar esse processo é necessário conversar com familiares a respeito do desejo de se tornar um doador de órgãos após a morte. A cor verde simboliza a esperança daqueles pacientes que aguardam nas filas de transplantes e também a vida que é salva a partir deste ato altruísta.
Beatriz Castro, estudante que recebeu um fígado transplantado a seis meses, percebeu uma mudança importante em sua vida após a cirurgia. “A Bia de agora é uma Bia muito melhor, onde eu passo todo mundo fala que eu estou com uma cara bem melhor, que eu estou com uma cara de saúde, e eu consigo fazer as coisas mais sozinha agora também, não passo mais mal como antes”, conta Beatriz.
No Brasil, existem muitos mitos a respeito de se tornar doador, como por exemplo questões relacionadas ao tráfico de órgãos, deformação do corpo após transplante e outras falácias que apenas interferem nas doações. No entanto, esse tipo de mentira só será combatida a partir da conversa aberta sobre o tema, principalmente com familiares próximos que serão as pessoas responsáveis por essa decisão caso ocorra a morte encefálica de um paciente.
Imagem ilustrativa da fita verde que simboliza a campanha do "Setembro Verde". (Foto: Reprodução/ Freepik)
Como fazer para se tornar doador de órgãos e tecidos no Brasil ?
Existem dois tipos de doador, o vivo e o falecido. O processo de doação com pessoas vivas só é possível para um dos rins, parte do fígado, parte da medula óssea ou parte do pulmão. E para que isso aconteça é necessário que o doador seja maior de idade, juridicamente capaz, saudável e que o ato não prejudique a sua própria vida. Além de, obviamente, ser um indivíduo saudável e com compatibilidade sanguínea. Mesmo depois de todos esses requisitos, o médico responsável deve avaliar o histórico clínico e as doenças prévias do possível candidato.
No quesito legislativo, parentes de até quarto grau e cônjuges podem ser possíveis doadores. No caso de pessoas vivas sem parentesco, só acontece mediante autorização judicial, para garantir que os motivos do ato sejam altruístas e não antiéticos.
Já no caso de doadores falecidos, o processo é outro. O argumento da doação só entra em questão após diagnosticada a morte encefálica (cerebral) ou por parada cardíaca. Nesse contexto, os órgãos que podem ser doados incluem: rins, coração, pulmão, pâncreas, fígado e intestino; e tecidos. Porém a doação só acontece mediante a autorização do familiar responsável pelo falecido, por isso a necessidade de deixar explícito em vida a vontade de se tornar doador. Segundo Alan Melquiades, diretor assistencial do Programa Estadual de Transplante do Rio de Janeiro, essa decisão pode significar uma vida salva. “Eu posso ressignificar esse sentimento que eu estou tendo quando eu perco um familiar de tentar mudar o desfecho de alguém que ainda tem possibilidade”, afirma o diretor.
A importância do diálogo entre familiares
O Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, possui o maior programa público de transplantes de órgão e tecidos, e isso só é possível devido aos doadores e colaboradores que participam desta ação. Por mais que o país seja referência nesse quesito, atualmente, no Brasil, existem cerca de 78 mil pessoas na fila de transplante esperando por um órgão ou tecido.
Assim, para mudar esse cenário e aumentar o número de doações feitas, é necessário dialogar com familiares próximos e expressar a vontade de se tornar um doador após a morte. Ainda segundo Alan, “só existe a possibilidade do transplante, se houver a doação”.
Campanha de conscientização sobre a doação de órgão e tecidos do Ministério da Saúde de 2024. (Foto: Reprodução/ Portal Gov)
Como funciona o transplante de órgãos no Brasil ?
O transplante é um processo delicado e criterioso. Por se tratar de uma cirurgia de retirada e colocação de um órgão ou tecido em um ser humano, a equipe necessária para que isso aconteça se estende e coopera por todo o país. No Estado do Rio de Janeiro, o órgão responsável por garantir que esse processo seja feito da maneira correta é o Programa Estadual de Transplante (PET). É a partir dessa organização que a equipe médica e de transporte sabe quem irá doar o órgão e para onde ele vai. Localizada na cidade do Rio de Janeiro, o programa comanda e organiza todas as doações que acontecem no Estado, transitando entre regiões quando necessário.
Além das questões médicas envolvidas, outro fator de extrema importância para que um transplante aconteça é o tempo de viabilidade do órgão. Dependendo da parte do corpo a ser doada, esse tempo entre achar o órgão, sinalizar o candidato da fila de transplante, preparar o paciente, transportá-lo, entre outros processos envolvidos, varia de acordo com a situação.
Porém, em qualquer uma delas, o tempo é corrido e exige a cooperação e o trabalho árduo de muitos funcionários da área para que o transplante aconteça e essa vida seja salva. “Eu acho que essa responsabilidade dividida, desde o psicólogo que faz a abordagem com a família para a solicitação dos órgãos, até a equipe que vai realmente transplantar o órgão, é magnífica! É uma rede de amor, uma rede que funciona de forma coesa e com grande amor ao que fazemos”, afirma Carlos Frederico, capitão do Corpo de Bombeiros e piloto da Superintendência de Operações Aéreas da Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro, que trabalha com o programa de transplantes de órgãos do Rio.
Como funciona a lista de espera por um transplante ?
A lista de espera por um transplante no Brasil é primeiramente separada por estados e, no Estado do Rio de Janeiro, de acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 2.500 pessoas esperam por um órgão (sem incluir tecidos, medula ou córnea). Tal dado é alarmante e indica a necessidade de mais doadores no país.
Para os pacientes que fazem parte da fila, a espera é uma constante dúvida do futuro e da urgência que cada um enfrenta. “Eu aguardo na fila já há sete anos. O tempo de espera costuma ser de dois anos, no meu caso ele é maior porque o meu sangue é o tipo B que é um sangue mais raro”, afirma Fábio Ferreira, professor de inglês que está na fila de transplante por um rim.
Ainda segundo o pedagogo, a rotina não é mais a mesma. “Hoje eu me restrinjo a trabalhar online porque eu não tenho mais força física pra ficar em pé durante muito tempo, para caminhar durante muito tempo. O principal impacto é a falta de resistência que um dia já tive”, explica Fábio. Além da dificuldade de locomoção, o professor também passa por um tratamento de hemodiálise que acontece três vezes na semana, nas quais ele precisa permanecer no hospital por cerca de quatro horas. Por ser uma falência renal, essa opção é possível e o mantém estável.
Na Barra da Tijuca, dois hospitais são autorizados a realizar transplantes de órgãos. São eles o Hospital Vitória (Av. Jorge Curi, 550) e o Hospital Barra Day (Avenida Armando Lombardi,1000).