Jacarepaguá e Guaratiba são alguns dos sítios arqueológicos da cultura indígena no Rio; entenda a história dos povos originais na região 

 

Por: Déborah Gama

Presentes no território brasileiro muito antes de 1500, os povos nativos marcaram as origens do Brasil e ainda influenciam regiões, mesmo que o carioca não perceba. Nesta sexta-feira, 19 de abril, é celebrado o Dia dos Povos Indígenas, que dá destaque à diversidade cultural, reforça a importância da preservação cultural e histórica do povo, assim como dá voz às lutas atuais da comunidade. 

 

Dia do Índio ou Dia dos Povos Indígenas?

Em 1943, influenciado pelo Marechal Cândido Rondon (descendente de três povos indígenas), Getúlio Vargas emitiu um decreto-lei que estabelecia o dia 19 de abril como "Dia do Índio", um termo um tanto quanto colonialista. 

A partir da Lei 14.402, promulgada em 8 de julho de 2022, de autoria da primeira deputada indígena, Joênia Wapichana, o antigo termo referente à data nacional foi substituído por Dia dos Povos Indígenas.

A data rememora o ano de 1940, quando foi realizado o 1º Congresso Indigenista Interamericano na cidade Pátzcuaro, no México. Uma das decisões do Congresso foi a instauração do Dia do Índio - assim chamado na época -, que em 1943, tornou-se no Brasil umas das principais datas de mobilizações e lutas dos povos indígenas. 

 

Origens indígenas do Rio

O que os bairros Jacarepaguá, Guaratiba, Maracanã, Tijuca e Irajá têm em comum? Todos têm nomes com significados indígenas, o que reflete a presença ancestral dos povos originários - não apenas nos respectivos locais, mas no Rio de Janeiro como um todo. 

"Todo o território municipal e estadual do estado do Rio de Janeiro foi habitado por originais, sendo território indígena. Nisso, falamos sobre a floresta tropical e a mata atlântica. Então podemos perceber que as populações anteriores tinham um grande quintal de casa", explica Vahnessa Musch. 

Enquanto descendente do povo indígena Goytacá, a guia de turismo pedagógico também se apresenta com seu nome da mata: Corópo Saruçu. Nascida em Campo Grande, na Zona Oeste, ela está radicada há 13 anos em Jacarepaguá. 

Jacarepaguá significa Lagoa Rasa dos Jacarés, em tupi-guarani. (Foto: Reprodução/Internet)

Além disso, Vahnessa também é tutora de quatro pets, passista e ativista visual, ao utilizar a fotografia para gerar reflexões sobre assuntos ligados a natureza, família e sociedade. Uma parte importânte de sua vida é a jornada de auto identificação com a ancestralidade do povo Goytacá, que teve início em 2019, quando começou a estudar a árvore genealógica da família. 

O grupo Goytacá é tido como extinto pela FUNAI (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), embora exista um movimento de retomada na área de Campo dos Goytacazes, e ao pesquisar suas descendências familiares, Vahnessa encontrou uma dificuldade no Rio de Janeiro. 

"Aqui no Rio, o processo de apagamento, com falta de dados e documentos, é grande", afirma. 

Para combater a desinformação, Vahnessa Musch monta roteiros com este foco: dar protagonismo ao resgate da história indígena carioca e das minorias, como mulheres, negros LGBTQIA+ e ciganos. 

"Falar sob a perspectiva indígena e contar a verdadeira história sem a romantização e os apagamentos dos livros, narrando a decolonialidade, é a minha missão. Busco acender um alerta para quem acompanha os meus roteiros e conscientizar a população sobre a preservação do meio ambiente e consciência de classe", destaca a indígena. 

 

De caminhos originários para estradas asfaltadas

Os peabirus significam, na língua tupi, "caminhos de gramado amassado" e consistem nas antigas rotas formadas e utilizadas pelos povos indígenas da região, que ligava o litoral do estado ao interior do continente. 

Vahnessa Musch explica que os trajetos tão conhecidos pelos moradores, como a Estrada dos Bandeirantes (que liga Taquara e Recreio) e a estrada Grajaú-Jacarepaguá, são caminhos originais criados pelos povos indígenas, por onde a cidade começava a se deslocar. 

A estrada que liga Grajaú e Jacarepaguá foi uma das rotas criadas por povos indígenas. (Foto: Reprodução/Internet)

 

Quem eram os povos que moravam na região? 

Esta pergunta não é fácil de ser respondida. Mesmo em meio ao histórico um pouco embaçado da falta de registros, devido ao costume indígena da oralidade, os primeiros povos registrados no Rio foram os sambaquis (do tupi, "monte de conchas"). 

Eles já viviam no litoral carioca quando os tupis chegaram, vindos da Amazônia. Segundo arqueólogos, a população original provavelmente foi eliminada por esses índios, que eram canibais. 

Vahnessa reforça a presença dos tupinambás (ou tamoios) em todo o território da costa do Rio. Esse povo veio da região do Mato Grosso, em círculos migratórios - um que subia pela Amazônia e descia até o litoral, e outro que desce pela região do Rio Grande do Sul e chega até a costa. 

Antes da chegada dos tupinambás, o território carioca já era ocupado pelo povo goytacá, então quando os dois povos se encontraram, houve um embate. As disputas ainda aconteciam quando os europeus chegaram à região para colonizá-la. 

 

Sítios arqueológicos indígenas em Guaratiba e Jacarepaguá

Vahnessa, descendente do povo Goytacá, um dos originais cariocas, explica que a região do complexo de Jacarepaguá é muito importante para sua cultura, por ser um cemitério de indígenas.

"Fazia parte do ritual tradicional dos Goytacazes reunir os entes queridos falecidos em urnas e enterrá-los no entorno das lagoas, porque eles tinham uma grande conexão com a água", diz a ativista indígena. 

O povo Goytacá destacava-se pela alta estatura. (Foto: Reprodução/Internet)

O significado de Goytacá, no tupi, é: Povo bom no nado e na corrida. 

Com muita flora, fauna e manguezal, a região de Guaratiba também é um sítio arqueológico da cultura indígena e importante para os estudos dos povos originais. 

"Nós éramos habituados à região de mangue, regiões alagadiças. O território carioca, antes dos processos de intervenção por conta do desmonte, dos morros que tinham na cidade, eram cheios de locais alagados", finaliza a guia.