Bernardo Caram (Folhapress)

A América Latina está presa em uma "armadilha do desenvolvimento", com alta desigualdade de renda e baixo crescimento econômico -problema agora agravado pelos efeitos da pandemia. A conclusão é do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), que divulga nesta terça-feira (22) o Relatório Regional de Desenvolvimento Humano para a América Latina e o Caribe.

As soluções, de acordo com o documento, passam por aprimoramentos em políticas sociais, combate à violência e redução da concentração de poder econômico e político. A chegada da crise sanitária do coronavírus, diz o documento, pesou mais fortemente sobre aqueles que já eram deixados para trás, ampliando as desigualdades ao longo de 2020 e 2021. A perda de renda se deu em maior intensidade sobre os mais pobres, especialmente os informais.

O documento lembra que a América Latina se tornou o epicentro da Covid-19, o que desencadeou crises econômicas e sociais. O aumento da pobreza e da fome se associou a um espaço fiscal limitado, o que dificulta a implementação de medidas pelos governos. Para o Pnud, a reconstrução pode levar muito tempo.

Entre as maiores preocupações, o relatório cita o impacto desigual da crise sanitária sobre estudantes. Há barreiras aos mais pobres, como na dificuldade de acesso a ferramentas tecnológicas em casa e na disparidade na formação dos familiares.

"O nível de escolaridade dos adultos na América Latina ainda é altamente determinado pelo nível de escolaridade dos pais. É provável que a Covid-19 reforce esse padrão", diz o relatório.

Os países da América Latina observaram uma redução generalizada nos índices de desigualdade entre 2000 e 2010. No caso do Brasil, o órgão da ONU (Organização das Nações Unidas) menciona como fator importante a política de reajuste do salário mínimo.

A partir de 2010, o ritmo de melhora foi perdendo força, chegando a uma estagnação nos últimos anos. Alguns países do continente reverteram a trajetória e observaram uma piora do índice antes mesmo da chegada da pandemia.

Um dos sintomas apresentados pelo Pnud para a desigualdade no Brasil é a fatia de renda acumulada pela elite. Os 10% mais ricos do país detêm 57% da renda nacional, atrás apenas da concentração observada no Chile e no México em uma avaliação feita com dez países do continente.

A desigualdade tem diferentes camadas que são analisadas pelo Pnud. O órgão menciona, por exemplo, a diferença de oportunidades entre homens e mulheres. No Brasil, elas ganham em média 25% a menos do que homens com características e formação equivalentes.

O documento ainda destaca a discriminação enfrentada por pessoas LGBT+ no mercado de trabalho, além de serem mais frequentemente vítimas de violência. O documento ressalta que minorias étnicas continuam a sofrer com falta de reconhecimento e ficam para trás no acesso a serviços básicos.

O relatório afirma que o desempenho econômico da América Latina nas últimas décadas é caracterizado por alta volatilidade e resultado medíocre. O crescimento médio dos países costuma oscilar entre zero e 3% ao ano.

Segundo o órgão, um fator determinante para esses resultados é a baixa produtividade comum aos países latino-americanos. O relatório traz uma pesquisa que busca compreender o que as pessoas pensam sobre a desigualdade. O argumento é que é importante conhecer a percepção de injustiça porque ela determina as atitudes políticas das sociedades.

No Brasil, por exemplo, 86% das pessoas acham que a distribuição de renda é injusta (a média da América Latina é de 81%). Além disso, 74% dos brasileiros acreditam que são governados por interesses de pequenos e poderosos grupos (média de 77% no continente).

De acordo com o Pnud, a concentração de poder nas mãos de poucos é um dos fatores que tendem a ampliar a desigualdade e o baixo crescimento. Esses grupos influenciam a elaboração de políticas distorcidas. E, segundo o documento, a América Latina é dominada por um pequeno número de empresas gigantes com alto nível de poder.

"Essa influência é exercida por meio de interferência nas reformas tributárias, de formas que vão desde o bloqueio de aumento de impostos para empresas e proprietários de empresas até o comprometimento de recursos fiscais, pressionando por isenções e subsídios para suas operações, o que impede gastos redistributivos", afirma.

Para eliminar essas distorções, o órgão da ONU sugere a revisão das regras de mercado para eliminar o favorecimento de interesses privados, além da promoção do debate sobre como tributar os super-ricos.

Outro ponto central para a proliferação da desigualdade está na violência. A América Latina abriga 9% da população mundial, mas é responsável por 34% das mortes violentas registradas no mundo.

Na pandemia, um fator se agravou de forma relevante nessa área, diz o documento. Houve aumento da incidência de violência doméstica. Para o Pnud, por ser vivenciada de forma desproporcional por pessoas que já se encontram em situação de fragilidade, a violência contribui para perpetuar a privação dessas populações. Além disso, ela deteriora direitos, piora a saúde física e mental, reduz resultados educacionais e limita a participação no mercado de trabalho.

Como forma de enfrentamento do problema, a ONU sugere estabelecer sistemas de Justiça mais efetivos, melhorar estatísticas, promover empoderamento econômico feminino e discutir a descriminalização de substâncias hoje ilícitas.

Outro problema observado no Brasil e países vizinhos é o mercado de trabalho segmentado entre formais e informais. Este último grupo é menos protegido, recebe serviços de qualidade inferior e tem maior dificuldade de melhorar as condições de renda.

O Pnud diz que a pobreza caiu na América Latina principalmente por causa de programas de transferência direta de recursos, e não tanto porque a renda auferida por conta própria pelos mais pobres aumentou.

O órgão afirma que a proteção social aos vulneráveis é uma das principais ferramentas para mitigar as desigualdades e sugere que toda a população exposta a um determinado risco seja coberta pelo mesmo programa, sem fragmentação.

Ana Paula Branco (Folhapress)

O STF (Supremo Tribunal Federal) tem maioria para negar o direito a um acréscimo de 25% no valor dos benefícios de aposentadoria que não sejam por invalidez. Até o momento, apenas os ministros Edson Fachin e Marco Aurélio foram contra o voto do relator, ministro Dias Toffoli.
O entendimento de Dias Toffoli diverge da decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que, ao julgar o Tema Repetitivo nº 982, entendeu ser devida a extensão do adicional de 25% às demais aposentadorias.
O julgamento no STF deve terminar ainda nesta sexta (18). Se não houver mudança nos votos da maioria, aposentados, que não por incapacidade, não têm direito ao adicional de 25%, mesmo que necessitem de ajuda permanente de outra pessoa. Por se tratar de Repercussão Geral, tribunais de todo o país devem seguir a decisão do STF.
"Vamos aguardar o acórdão para saber se haverá modulação, mas muito provavelmente [aposentados que já recebem o adicional] não terão que devolver, pois esse tem sido o critério adotado pelo STF em outros casos", afirma a advogada Adriane Bramante, presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário).
O adicional de 25%, popularmente conhecido como auxílio-acompanhante, pode ser solicitado quando o aposentado precisa de uma assistência permanente de outra pessoa (como um cuidador) para realizar as atividades do dia a dia, como se alimentar, tomar banho e se locomover.
Pela atual legislação previdenciária apenas aposentados por invalidez permanente tem direito ao adicional, mas segurados buscavam o Judiciário para comprovar a necessidade de assistência permanente de terceiro e do auxílio. Desde 2019, todos os processos estão suspensos, aguarando a decisão do STF.
"Embora pareça pouco o acréscimo de 25% aos que estão acamados, amputados, doentes a ponto de necessitarem de uma terceira pessoa permanentemente, significaria muito para a família", afirma Bramante.
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ADICIONAL DE 25% PARA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ
O INSS aceita as seguintes situações como causa do recebimento do adicional de 25% para a aposentadoria por invalidez:
- cegueira total;
- perda de no mínimo nove dedos das mãos;
- paralisia dos dois membros superiores ou inferiores;
- perda dos membros inferiores, acima dos pés, quando a prótese for impossível;
- perda de uma das mãos e de dois pés, ainda que a prótese seja possível;
- perda de um membro superior e outro inferior, quando a prótese for impossível;
- alteração das faculdades mentais com grave perturbação da vida orgânica e social;
- doença que exija permanência contínua no leito;
- incapacidade permanente para as atividades da vida diária

A necessidade tem que ser comprovada por documentos, laudos médicos e perícia médica.

Bernardo Caram e Danielle Brant (Folhapress)

O governo está finalizando a proposta de reforma do IR (Imposto de Renda), com previsão de envio do texto ao Congresso ainda nesta semana. Em um dos principais eixos da medida, não deve ser cumprida a promessa eleitoral do presidente Jair Bolsonaro de aumentar a faixa de isenção para rendas de até cinco salários mínimos.

De acordo com um membro do Ministério da Economia, a pasta está em negociação final com Bolsonaro, mas o martelo ainda não havia sido batido até o início da tarde desta terça-feira (22).

Segundo relato, o Palácio do Planalto ainda pressionava por alterações que inviabilizariam a conta da reforma. Entre os pontos de discordância, auxiliares do presidente estariam pressionando contra a taxação de investimento hoje isentos.

Durante a campanha eleitoral de 2018, Bolsonaro afirmou que seu até então assessor econômico Paulo Guedes havia formulado proposta de reforma do IR com isenção para rendas de até cinco salários mínimos (R$ 4.770 em valor da época, ou R$ 5.500 hoje) e cobrança de 20% sobre todas as outras rendas.

A proposta finalizada agora, com Guedes no posto de ministro da Economia, pode não chegar à metade do valor prometido pelo presidente. Os cálculos mais recentes do time do ministro apontavam para um aumento da faixa de isenção dos atuais R$ 1.903,98 para R$ 2.400. O patamar também é menor do que o apresentado por Bolsonaro no início deste ano, quando afirmou que tentaria ampliar a faixa para R$ 3.000 em 2022. Na ocasião, ele argumentou que gostaria de alcançar o valor de R$ 5.000, mas disse que não conseguiria por causa da pandemia, que aumentou muito o endividamento do governo.

A reestruturação do IR será a segunda etapa da reforma tributária do governo. De acordo com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o governo prevê a apresentação da proposta para esta quarta-feira (23).

A primeira fase da reforma, que unifica Pis e Cofins para criar a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), está no Congresso sem previsão de votação. O plano de Guedes para o IR da pessoa física deve mudar apenas a faixa de isenção, sem alteração nas alíquotas existentes hoje, que variam de 7,5% a 27,5%.

Além disso, Guedes quer reduzir e unificar em 15% cobranças sobre investimentos em renda fixa, hoje regidos por uma tabela regressiva que vai de 22,5% a 15%, a depender do tempo de aplicação. Os detalhes da reestruturação já haviam sido antecipadas à Folha pelo ministro.

Para ampliar a arrecadação, a ideia é acabar com a isenção de produtos financeiros como LCI (Letra de Crédito Imobiliário), LCA (Letra de Crédito do Agronegócio), CRI (Certificado de Recebíveis Imobiliários) e CRA (Certificado de Recebíveis Agrícolas). Este seria um dos pontos de pressão contrária vinda do Planalto.

O pacote do ministro também prevê a criação de tributação sobre a distribuição de dividendos, hoje isenta e que passaria a ser taxada em 20%. Nesse ponto, também houve pressão da ala política e o governo avalia criar uma faixa de isenção para ganhos de até R$ 20 mil por mês com dividendos.

Ainda na tributação sobre empresas, o plano prevê um corte de cinco pontos percentuais na taxação de IR de pessoas jurídicas. O patamar cairia de 25% para 20% em um período de dois anos. O governo deve propor ainda a extinção do mecanismo de JCP (Juros sobre Capital Próprio), outra forma de distribuição de recursos aos acionistas.

Danielle Brant (Folhapress)

O governo adiou para a próxima quarta-feira (23) a entrega do projeto que muda o Imposto de Renda para pessoas físicas, jurídicas e que trata de dividendos, informou nesta sexta-feira (18) o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).
Lira participou na manhã desta sexta de uma videoconferência sobre reforma tributária promovida pela diretoria da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
O deputado afirmou que esperava que o projeto que trata do Imposto de Renda de pessoa física, jurídica e dividendos fosse entregue pelo governo nesta semana.
"Não veio, isso foi postergado para a próxima quarta-feira", disse. "Ainda precisamos de ajuste entre Casa Civil, entre Ministério da Economia e presidente da república para que o projeto tenha limitações, tenha um enquadramento", afirmou Lira, ressaltando que a intenção é não distorcer a arrecadação nem aumentar impostos.
Lira indicou que ainda não houve acordo sobre a progressão da tabela de Imposto de Renda de pessoa física, jurídica e dividendos. "A gente tem que partir da máxima de que não é justo que quem ganhe menos pague mais e quem ganhe mais pague menos", disse.
"Há uma distorção no sistema de dividendos no Brasil com relação ao mundo. É justo que a gente faça essa discussão. E isso fortalece as indústrias, fortalece as pessoas jurídicas, fortalece as empresas num sistema de que talvez se você tiver uma taxação maior em estar recompondo ou transferindo lucros para as pessoas físicas de um pagamento que foi feito, talvez, numa pejotização ali numa pessoa jurídica, isso torna o problema mais crítico."
Segundo ele, a ideia é iniciar a discussão do texto na Câmara assim que o projeto for entregue. "E com esse faseamento, com essa vinda deste projeto, a gente starta na Câmara toda discussão da infraconstitucional, que também vem do Senado para cá com o passaporte tributário", ressaltou.
"E a PEC [Proposta de Emenda à Constituição] nós tivemos o entendimento de que é mais fácil, talvez, o início da votação pelo Senado, sob relatoria do senador Roberto Rocha [PSDB-MA], com a participação também da Câmara na discussão de um texto que fique mais cômodo."
Segundo o presidente da Câmara, a discussão contempla uma alíquota de 12% de PIS/Cofins. Os estados teriam uma carga de 10% e "municípios entrariam e o governo federal ainda se disporia a abrir mão de 2% desses 12%, para que ficasse 10%, 10% e 2%, num total de 22%".
A reforma tributária proposta pelo governo será moderada, indicou o próprio ministro Paulo Guedes (Economia). Mesmo defendendo uma reforma ampla, com desoneração da folha de salários, ele ponderou que agora não é o momento e que o governo fará o que é possível.
A expectativa é que seja votado o projeto que cria a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), enviado pelo governo em setembro do ano passado e que começa a tramitar pela Câmara.
No Imposto de Renda, a única mudança possível deve ser um aumento da faixa de isenção dos atuais R$ 1.903,98 para um patamar abaixo de R$ 3.000. O formato em estudo prevê isenção do imposto para rendas mensais de até R$ 2.500.
A Economia vai propor mudança de tributação sobre investimentos. Aplicações que hoje são isentas, como LCI (Letra de Crédito Imobiliário) e LCA (Letra de Crédito do Agronegócio), passarão a ser taxadas.
Como antecipou a Folha de S.Paulo, alíquotas do IR sobre investimentos em renda fixa devem ser unificadas em 15% –hoje a cobrança varia de 15% a 22,5% a depender do período de aplicação.
No plano considerado ideal pelo ministro, o imposto aos moldes da extinta CPMF poderia ser usado para compensar a perda de receita com a redução de outros tributos.
Sem a arrecadação anual de R$ 120 bilhões estimada para o novo imposto, a equipe econômica afirma que não será possível fazer a redução de encargos trabalhistas e outras reduções de alíquotas.
Também devem ficar de fora da proposta do governo um corte mais intenso no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e uma redução das alíquotas do Imposto de Renda da pessoa física.